segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Reflexão # 52 - Pais e Filhos Esculpindo-se...

Quantos de nós, pais em constante e permanente aprendizagem, crescimento, já não se viu a cometer aqueles velhos padrões de sempre, que saltam no momento menos esperado, automáticos e com tanta força que nos cegam e nos levam a fazer e dizer tudo aquilo que gostaríamos que fosse diferente? Pois bem, eu sou um desses, uma dessas… um adulto que carrega feridas, traumas, frustrações profundas e que decidido a olhá-las de frente, assume a sua ignorância, impotência, limitação e desejo de com tudo isso fazer diferente, melhor e de acordo com a natureza amorosa, sensível, compassiva, que fundamentalmente nos compõe.
Vestir o papel do pai ou mãe que pretende adquirir um estatuto de bom, perfeito, dedicado, consciente, porque fala de determinado modo, defende determinadas ideologias, age segundo formas, maneiras e propósitos teorizados por estudiosos e pessoas reconhecidas pelo imenso know how, sem assumir, reconhecer as suas dores, fragilidades, vulnerabilidades, expondo abertamente para um filho com toda a humildade, amor e vontade de poder fazer melhor e diferente, é como ir à beira do mar mergulhar uma onda e ficar convencido que por isso conhece o oceano.
Que adianta falar de sentimentos, emoções, de gestão de conflitos, stress, educação consciente e por aí vai, se sou intolerante aos meus erros, rotulando-me de incapaz, de mais ou menos que este ou aquele? Se na mente desenhei um ideal para se conquistar, um monte de tralha a se provar, de toda a culpa me livrar e fantasiosamente ver-me amar? Sem chance… na primeira contracurva vou espatifar-me entre um grito, um estalo, um castigo, uma ordem… e o pior é que vou lamentar-me pelo sucedido e tentar reparar o estrago com abracinhos, beijinhos, facilidades, permissividades, passividades e por aí vai… 
De verdade não estarei a contribuir para que uma criança reconheça e se reconheça… não estarei a contribuir para que ela cresça confiante com as suas fragilidades, erros, dificuldades…
Estarei a pintar na sua mente uma mera imagem e miragem...
Estarei num mesmo ciclo de sempre mascarando-o apenas de novas formas e cores…
Educar de forma autêntica e genuína é contribuir para seres autênticos e genuínos. Para isso preciso escancarar os meus medos, descer do pedestal, ver quanto sou limitado e condicionado, ver como carrego dor, sofrimento e fazer de tudo isso o barro com o qual vou esculpir uma peça que comunica amor, paz e liberdade.
Juntos nos esculpiremos…
Juntos nos ajoelharemos num abraço que grita: “Amo-te” …
Juntos lamentaremos, manifestaremos nosso desejo de aprender, escutar e crescer…
Juntos pediremos aos deuses, às fadas, ao universo, sabedoria, acolhimento, amparo…
Juntos daremos as mãos, caminharemos com a leveza de um coração que não exige, apenas É, e uma mente que pacientemente se vai esculpindo manifestando e expressando palavras, gestos amorosos, delicados, harmoniosos e pacíficos…
Juntos nos comprometeremos e respeitaremos… a dor de uma criança que vê o seu cavalo imaginário ser destruído e desconsiderado é a mesma do adulto que igualmente vê as suas palavras, indicações e desejos…
Possamos nós através das nossas crianças contar uma outra história e simultaneamente fazer as pazes com a nossa…
Harih Om
Sónia


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